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Trabalho minucioso faz jus à importância do autor alagoano

Publicado em 20 d outubro d 2012

2012: 120 anos de Graciliano    

Folha de S. Paulo
Por WANDER MELO MIRANDA
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Numa época de banalização, ele continua a ser um exemplo extraordinário de homem de cultura

A primeira impressão da leitura dos textos de Graciliano Ramos ora reunidos em livro confirma a coerência de sua variada atividade como escritor de crônicas, ensaios e discursos. Em conjunto, articulam-se como um amplo painel da primeira metade do século 20, composto por uma sensibilidade muito especial, capaz de unir compromisso político e fazer literário, sem cair em soluções fáceis ou armadilhas panfletárias.

Desde as contribuições para jornal nos anos de 1910 até os discursos como militante comunista a partir de 1945, o que esses textos revelam é uma incontida paixão pelo real, submetido com força de persuasão ao rigor da forma literária. Com a mesma ironia investe contra os políticos de província e os literatos de plantão, reclamando de uns e outros maior atenção para com a realidade circundante: a distribuição de luz elétrica em Palmeira dos Índios, a possibilidade de utilização do álcool como combustível, o voto das mulheres, a necessidade de expressão popular ou a afirmação dos negros no romance de Jorge Amado.

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ROMANCE DE 30

O elogio que faz ao então principiante Guimarães Rosa, cuja primeira versão de “Sagarana” examina num concurso literário, é elucidativo da posição assumida. Entusiasma-se com o autor mineiro porque nele é “tudo real, nacional e bárbaro”. Vale destacar a reflexão que Graciliano empreende sobre a literatura, por condensar as preocupações norteadoras de sua a tarefa como intelectual e artista.

Insiste na importância dos romancistas de 30, por deslocarem o centro geográfico e simbólico do poder literário, trazendo o sertão e a periferia das cidades à cena do texto e da então capital federal do país. Bate-se contra a introspecção dos romancistas “católicos” com a mesma força com que se opõe ao descritivismo documental.

“Por muito realistas que sejamos, não temos a pretensão de apanhar a realidade pura. Dela sabemos o que os nossos nervos transmitem, mas como a experiência alheia não nos desmente, apossamo-nos de uma pequenina verdade relativa, verdade contingente e humana.”

Essa parece ser a verdade do intelectual Graciliano Ramos, premido entre o jogo de classes e o engajamento político, no limite estreito de sua relação com o partido ou na relação conflituosa entre seus pares na Associação Brasileira de Escritores (ABDE), sem falar na experiência carcerária que sofreu e nos seus desdobramentos.

Em todos os momentos, reafirma a necessária profissionalização do escritor, como no discurso que faz na célula Theodore Dreiser do PCB. “Essa certeza de que o escritor é um profissional é que precisamos fortalecer em torno de nós.” Numa época de banalização da literatura, Graciliano Ramos continua a ser um exemplo extraordinário de homem de cultura.

O trabalho minucioso do organizador Thiago Mio Salla faz jus à importância do escritor, ao recuperar referências essenciais para melhor compreensão de sua trajetória luminosa.

WANDER MELO MIRANDA, é professor de teoria da literatura na UFMG.

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CONHEÇA A OBRA DE GRACILIANO RAMOS

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  • Caetés – edição especial 80 anos (2013)
  • S. Bernardo (1934)
  • Angústia (1936)
  • Angústia – edição especial 75 anos (2011)
  • Vidas Secas (1938)
  • Vidas Secas – edição especial 70 anos (2008)
  • Vidas Secas – em quadrinhos (2015)
  • Infância (1945)
  • Insônia (1947)
  • Memórias do Cárcere (1953)
  • Viagem (1954)
  • Linhas Tortas (1962)
  • Viventes das Alagoas (1962)
  • Garranchos (2012)
  • Cangaços (2014)
  • Conversas (2014)
  • A Terra dos Meninos Pelados (1939)
  • Histórias de Alexandre (1944)
  • Alexandre e Outros Heróis (1962)
  • O Estribo de Prata (1984)
  • Minsk (2013)
  • Cartas (1980)
  • Cartas de Amor a Heloísa (1992)
  • Dois Dedos (1945)
  • Histórias Incompletas (1946)
  • Brandão entre o Mar e o Amor (1942)
  • Memórias de um Negro (1940) Booker T. Washington, tradução
  • A Peste (1950) Albert Camus, tradução

Queria endurecer o coração, eliminar o passado, fazer com ele o que faço quando emendo um período — riscar, engrossar os riscos e transformá-los em borrões, suprimir todas as letras, não deixar vestígio de idéias obliteradas.

Memórias do Cárcere, cap. 5